O hábito faz parte do monge
Costuma dizer-se “o hábito não faz o monge”. Pois não, mas ajuda. A importância dos nossos hábitos pessoais é mais que muita hoje, nestes tempos de clausura, que não se quer monástica mas que mesmo assim continua a ser de alteração dos nossos hábitos sociais.
Creio que, se estamos fechados em casa para não dar hipótese ao vírus, devemos manter algumas rotinas pessoais que podem parecer coisa pequena mas que fazem parte daquilo que somos. Bem sei que é fácil perder composturas e “pôr-se à vontade” quando se está em casa. Mas, precisamente, não estamos em casa de fim de semana nem de férias. Estamos em situação extraordinária e que se quer activa. Por um lado nada mais natural do que nos deixarmos estar o dia todo com o pijama com que dormimos, por outro, despi-lo e vestir outra roupa implica um símbolo de prontidão e actividade.
Essa atitude e forma de estar ajuda a que nos sintamos úteis, activos, a fazer parte do imenso esforço que está a ser feito por todo o lado. Mas também a continuarmos a sermos nós, a mostrar ao mundo que está lá fora e não nos vê, que sou eu e não outro quem está aqui, de pé, são e firme. Também para quem está em casa connosco. Continuo a ser eu, como todos os dias, para ti, bonito, disponível, bem disposto, com força, elegante. Continuo a ser sensual como sou, interessante no que mostro, a merecer o teu respeito.
Por isso, todos os dias continuo a olhar pela janela fora para o mundo, a fazer a barba, a fazer 20 minutos de máquina de remo, a tomar um duche rápido para poupar água, a mudar de roupa do dia, a comer as minhas torrada de pequeno almoço, a ler umas quantas notícias que me vêm parar ao telemóvel. E, depois de estar pronto, abrir o computador e começar.
Depois, o dia corre como tiver de correr. Não posso ir para o consultório e dar as minhas consultas. Mas posso manter-me em contacto com os meus pacientes, segui-los, ajudar no que puder, aconselhá-los. Paralelamente, posso estudar, ler, escrever, pesquisar. Tudo coisas ligadas à actividade profissional que exerço. Mantendo assim alguma normalidade dentro da anormalidade que são estes tempos.
Cuidar da higiene, da imagem e da emoção pessoais, parece-me por tudo isto fundamental. Ajuda a que nos sintamos equilibrados e, ao o sentirmos, equilibramo-nos. Ao estarmos mais equilibrados equilibramos os demais. Os que vivem connosco no mesmo espaço e os com quem contactamos virtualmente. Pode parecer pouco mas coisas poucas como vestir roupa de rua, fazer a barba ou pôr perfume fazem de facto a diferença.
Mantém-nos na civilização e na sociedade, activos, reconhecíveis. Porque o hábito faz parte do monge.