Universos

Todas as noites, quando me vou deitar para ir dormir, olho para o tecto do quarto depois de apagar a luz. E vejo pequenas estrelas e planetas a brilhar num Universo limitado mas que é só meu naquele momento. 

São estrelas de vários tamanhos, com cinco pontas e brilhantes. Os planetas são redondinhos e também têm vários tamanhos. Todos eles emanam uma luz suave e amarelada. São cuidadosamente recortados e, embora não sejam como as estrelas no céu, todos estes astros são belos e dão-me uma sensação de paz, boa para adormecer. São muitos, espalhados por todo o tecto do quarto, dando de facto a sensação de uma abóbada celeste sem ser celeste. Foi a minha namorada que os recortou um dia, antes de eu a conhecer, cuidadosa e pacientemente, um a um e imagino que devagar e com carinho, antes de os colar no tecto, cada um no seu lugar especial para sempre. São feitos de um papel daqueles que absorve a luz e depois, no escuro, a devolve. Ficam por isso brilhantes durante bastante tempo. O tempo suficiente para que adormeça a olhar o firmamento do nosso tecto.

Não se movem, nem as estrelas nem os planetas do meu céu de todas as noites. Nem cintilam em luzinhas tremeluzentes, como fazem os astros a sério no céu lá fora. Mas, por serem estáticos e finitos, dão justamente uma sensação de segurança e não de angústia do infinito. E ali não tenho frio nem sinto o vento. Nem há nuvens nem luzes que tapem o brilho das estrelas. Nem há aquele vórtice que termina no estômago quando olhamos com atenção a incomensurável infinidade do Universo de que fazemos parte. Ali não. É só o meu Universozinho pessoal e seguro, o de todas as noites, que me acompanha o sono, o que me aconchega a alma depois de mais um dia que correu bem ou mal, não importa. Está sempre lá, a brilhar no escuro dos meus olhos com a luz apagada. E sinto-me bem.

Mas claro que me sinto bem porque este Universo de brincar que me cobre os sonhos faz-me lembrar o Universo a sério que nos cobre a vida. E esse é terrivelmente belo e enorme, em todos os sentidos. E esse é o incompreensível até nos chegar à náusea de tentarmos vê-lo, compreendê-lo, abarcá-lo e não o conseguirmos. A violência que é só se compara com a calmaria e a beleza que pode transmitir. A insignificância que temos e sentimos ao olhar para ele só é igualada pelo orgulho de lhe pertencer. E, talvez por isso mesmo, sou sempre impelido a olhá-lo embora tenha por vezes medo de o olhar, porque demasiado grande e esmagador.

Mas no céu de brincar do meu tecto no nosso quarto tenho a minha medida certa, entre tudo o que é o Universo a sério e o conforto do pequeno, finito e de brincar. E, em cada uma das estrelitas e planetas recortados, recebo a luz frágil e delicada do amor de quem criou este Universo à minha medida antes de me conhecer.

Como em tudo, no Universo a sério como neste a brincar, vejo Yin e o Yang, extremos opostos que se combinam e que não existem um sem o outro para mim. Um expansivo, violento, cheio de energia, esmagador, o outro estático, calmo, tranquilo, finito. Ambos belos e necessários.